Quais foram os desafios e os aprendizados da educação diante de um cenário de aulas remotas? O que esperar para o próximo ano? Confira a análise
Tudo estava caminhando como de costume. Planejamento anual, reuniões de equipe e início do ano letivo. Até que março chegou e trouxe uma situação sem precedentes para a educação: as escolas tiveram que ser fechadas para conter a disseminação do coronavírus. A partir daí, professores de todo país tiveram que lidar com uma realidade desconhecida e se apropriar das tecnologias em tempo recorde para gravar vídeos, criar atividades e promover aulas remotas.
Diante de tantas demandas, também surgiram pequenas conquistas e projetos inovadores que não mediram esforços e nem distância para engajar os alunos do outro lado da tela, na frente da televisão, ao lado do rádio ou até mesmo sós com alguns materiais impressos.
Para refletir sobre esse cenário e trazer perspectivas para 2021, o Porvir reuniu depoimentos de professores de diferentes regiões do país que já publicaram seus relatos na seção Diário de Inovações. Em diferentes contextos educacionais, suas avaliações trazem retratos do que foi o dia a dia das aulas remotas. Confira a análise e também deixe sua opinião nos comentários:
Desafios da educação em tempos de coronavírus
1. Trabalhar em casa: Com a interrupção das aulas presenciais, o home office se tornou uma nova realidade para os professores. “Este ano de 2020, nos desafiou a conciliar as demandas escolares com as tarefas pessoais. Não havia mais hora para trabalhar e cada dia mais a escola adentrou nossa casa”, destaca a professora Carla Borges, que atua com turmas do 1º ano do ensino fundamental, em São Joaquim de Bicas e Sarzedo (MG).
2. Dominar a tecnologia: Se antes a tecnologia já era uma tendência na educação, durante as aulas remotas ela se mostrou absolutamente necessária. Em pouco tempo os professores tiveram que se apropriar de recursos, criar atividades e selecionar as melhores ferramentas para suas aulas. “Vasculhamos e interagimos com inúmeros aplicativos com o objetivo de incrementar nossas aulas, sofremos muito na produção dos conteúdos e vídeos produzidos”, reflete o professor de geografia Paulo Magalhães, da rede municipal de São Paulo (SP). Tudo isso ainda foi acompanhado das dificuldades com a infraestrutura e conectividade disponíveis para os estudantes e professores.
3. Criar novas estratégias pedagógicas: As aulas remotas deixaram ainda mais evidente para os educadores que era preciso investir em novas metodologias de ensino para conquistar o engajamento da turma. “Um dos desafios foi ressignificar as práticas pedagógicas, pensar nesse período de transição”, aponta a professora do ensino médio Socorro Braga, de Bragança (PA).
4. Preservar vínculos socioafetivos a distância: Do outro lado da tela, além de pensar nos conteúdos, os educadores ainda se esforçam para manter o vínculo com os estudantes. Esse foi uma das maiores questões para Cristina Van Opstal, professora em turmas de ensino fundamental e graduação na cidade de Santos (SP). “Se considerarmos que aprendemos muito melhor quando alguém ou algo nos toca, nos afeta e nos é significativo, a questão do vínculo assume um valor inestimável!”, ressalta.
5. Gerenciar o cansaço: As aulas online, as medidas de distanciamento social e contexto da pandemia também trouxeram muito cansaço, para os professores, estudantes e famílias. “Foi intenso, inseguro. Estar todos os dias frente a tela é cansativo e exaustivo. Por vezes, a impressão era que não íamos conseguir”, analisa a professora Viviane Cristina de Moraes Ferreira, que trabalha com alfabetização nos anos iniciais do ensino fundamental, em Valinhos (SP).
Aprendizados de um ano complexo
1. Lidar com as emoções: Diante de tantas pressões, uma crise sanitária, demandas e incertezas, 2020 também foi um ano para cuidar da saúde emocional e valorizar práticas de autocuidado. “Aprendemos e reaprendemos a lidar com os sentimentos e a busca de um novo saber que se apresenta para nós, educadores”, observa Paulo Magalhães.
2. Incorporar a tecnologia de vez na educação: Se tem algo que não deixou dúvidas em 2020 foi de que a tecnologia veio para ficar na educação. “Aprendemos neste ano que a tecnologia está cada vez mais presente em nossa profissão e também na vida dos alunos. Fizemos tudo o que era possível para buscar formações para este novo modelo de ensino”, menciona a professora Carla Borges. Mesmo quando não existiam recursos de ponto disponíveis, os educadores foram atrás de alternativas. “Acredito que cada um de nós buscou utilizar a tecnologia que cada um dispunha para fazer o melhor para os alunos”, completa a professora Márcia Santos, de Cruz (CE).
3. Repensar a avaliação: Em um contexto de aulas remotas, os professores também tiveram que repensar o formato e papel da avaliação, que se tornou cada vez mais formativa, baseada no desenvolvimento de competências e no envolvimento dos estudantes durante as atividades. O formato tradicional de prova foi colocado em xeque no ambiente virtual. “Fazer avaliação em casa? Isso parecia um absurdo em março, mas era o que tínhamos e funcionou”, reflete a professora Eliane Barreto Maia Santos, de Curitiba (PR).
4. Trabalhar em parceria com a família: Para que os estudantes pudessem continuar se desenvolvendo em casa, o apoio da família também foi fundamental neste ano. “Muitas famílias puderam acompanhar melhor os filhos, e isso foi positivo também”, sugere Eliane Barreto Maia Santos.
Perspectivas para 2021
1. Políticas públicas de inclusão e equidade: A pandemia aprofundou desigualdades sociais e educacionais em todo país. Para não deixar ninguém para trás, no próximo ano será necessário investir na construção de políticas públicas de inclusão e busca por equidade. Questões como a desigualdade racial, evasão escolar e inclusão serão ainda mais urgentes. “Políticas públicas para inclusão social necessitam de entrar em vigor para que este novo modelo de ensino tenha maior abrangência”, analisa a professora Carla Borges.
2. Ensino híbrido: Com uma possível retomada das aulas, o ensino híbrido ganhou destaque como uma metodologia recomendada para mesclar momentos presenciais e remotos, sem perder a intencionalidade pedagógica. “Em 2021 é provável que usemos o tão desejado ensino híbrido, e lá vamos nós aprender a fazer isso na prática. Já aprendemos a trabalhar a distância, agora mesclar o ensino é o desafio do próximo ano”, pondera Eliane Barreto Maia Santos.
3. Metodologias ativas: Práticas que valorizam o protagonismo dos estudantes, a autoria, a exploração e a criatividade também devem estar mais presentes na educação no próximo ano. “O ensino híbrido – com uso das novas TICs – e as metodologias ativas vieram para ficar”, diz Cristina Van Opstal.
4. Formação de professores: 2021 também deve ser um ano para investir na formação de professores para trabalhar com novas metodologias e uso de tecnologia. “Tenho a esperança que seremos professores melhores, mediadores, focados na aprendizagem, mas isso tudo vai depender muito de formação. Vamos ter que querer e estudar com afinco as metodologias ativas. Elas dão um certo trabalho no planejar, mas isso é normal. Toda mudança provoca dor”, destaca Socorro Braga.