Por Francisco Mineiro
Queridos leitores:
Pelo título desta coluna, o perspicaz leitor vê que estamos continuando a série de eventos ocorrido em guerras e que beiram o inacreditável. As mentiras proliferam durante guerras, mas selecionamos acontecimentos improváveis que foram testemunhados e registrados em documentos oficiais.
“É muito melhor cair das nuvens do que de um terceiro andar” … a frase antológica de Machado de Assis refere-se à expressão popular “cair das nuvens” como sinônimo de tomar um susto, ou ter uma grande surpresa. Mas vamos hoje relatar duas histórias de soldados que literalmente caíram das nuvens e viveram para voar de novo.
O primeiro e mais incrível é o norte-americano Allan Eugene Magee. O rapaz alistou-se na Força Aérea de seu país logo após o bombardeio de Pearl Harbour. Foi qualificado como artilheiro de torre dos aviões B-17, os “Fortalezas Voadoras”. Seu trabalho era ficar numa bolha de vidro na parte inferior da aeronave, para atirar contra o solo ou aviões inimigos.

Em sua sétima missão, no dia 03de janeiro de 1943, Magee voava sobre a França ocupada pelos nazistas, quando seu B-17, parte do 303° Grupo de Bombardeiros, foi severamente atingido pela artilharia antiaérea alemã. A torre foi danificada, e o paraquedas de Magee rasgou. Tentava sair para a fuselagem, quando uma asa foi atingida e o avião entrou em parafuso. A força centrífuga atirou nosso personagem para fora da aeronave, e ele desmaiou com a falta de oxigênio. Caiu simplesmente 6.700 metros em queda livre, atingindo a estrutura feita de vidro e ferro do telhado da estação ferroviária de Saint Nazare. Foi resgatado pelos alemães com 28 fragmentos de munição antiaérea no corpo, ossos quebrados, pulmão e rim lesionados e um braço quase decepado… mas vivo! Em suas memórias, contou que o médico alemão que o recebeu disse: “Somos inimigos, mas primeiro sou médico. Vou fazer o que for possível para cuidar de você”.
Magee sobreviveu, e tornou-se popular entre os prisioneiros de guerra por conta de sua história. Um minucioso relato alemão confirmou sua queda sem paraquedas.
Ao fim da guerra, voltou para casa, mas levou a paixão pelo voo: decidiu ser aviador profissional. Trabalhou em inúmeros cargos na aviação até aposentar-se, aos 60 anos.
Em 1995 a cidade de Saint Nazare recebeu em festas Magee e outros veteranos, quando foi inaugurado um monumento em homenagem a ele e aos que morreram naquele fatídico janeiro.
Allan Magee faleceu aos 84 anos, em 2003.

Outro caso documentado é do ucraniano/soviético Ivan Mikailovich Chisov. Em janeiro de 1942, o Tenente de 25 anos era o navegador na tripulação de um bombardeiro médio Iliushin II-4, o qual foi pesadamente atingido por caças nazistas. Chisov saltou, com a aeronave a 7.000 metros do solo. A Convenção de Genebra proíbe atirar em paraquedistas em queda – mas os nazistas faziam isso com frequência. Por prevenção, decidiu que abriria seu paraquedas mais perto do solo. Só que o ar rarefeito fez com que ele desmaiasse e não acionasse o equipamento.
A vegetação, o terreno inclinado e a espessa camada de neve amorteceram sua queda. Ele caiu, rolou e deslizou morro abaixo, sendo visto por uma tropa de cavalaria próxima, comandada pelo General Pavel Belov. Acorrendo ao local, os militares o encontraram muito ferido, com fraturas na coluna e lesões na bacia… e com o paraquedas fechado. Ele foi levado a um hospital, sendo operado pelo cirurgião Y. Gudinsky. Apesar de ficar quase um mês em estado considerado grave, em apenas três meses Chisov estava novamente trabalhando. Retornou às aeronaves de combate, e foi posteriormente designado como instrutor de navegação. Participou de mais de 70 operações durante a II Guerra Mundial. Sua dedicação rendeu-lhe um grande número de condecorações, o que tinha grande valor na extremamente classista sociedade comunista. Apesar do comunismo pregar uma sociedade sem classes…
Ivan Chisov sobreviveu à longa Guerra, e ao final dessa ingressou na Academia Político-Militar soviética, chegando ao posto de Tenente-Coronel. Na reserva, tornou-se Oficial de Propaganda da Casa Central do Exército Soviético, o clube esportivo do Exército Vermelho, com abrangência nacional e gerenciado pelo Exército.
Chisov faleceu aos 70 anos, em 1986, poucos anos antes da União Soviética esfarelar.
Então caro leitor, entre bilhões de seres humanos que caminham sobre a Terra, de vez em quando a deusa Fortuna sorri para algum. Magee e Chisov fora dois destes.
Até a próxima.