Colunistas

O Esteio do Herói

Dona Ana Luísa de Loreto Carneiro Viana Alves de Lima, Duquesa de Caxias

Por Francisco Mineiro

Querido Leitor: ao vermos a imagem de um vulto histórico, raramente pensamos que se trata também de um ser humano. Uma pessoa com pais e irmãos, cônjuge e filhos, dores e alegrias. Não é diferente do merecidamente famoso Duque de Caxias.

Todos conhecem a imagem do soldado, do chefe militar de espada em riste, liderando tropas à vitória. Quem estuda História, reconhece seu valor como soldado e como político, no melhor sentido da palavra. Nas rebeliões dos períodos regencial e imperial, ele não lutou para dizimar irmãos brasileiros, mas para trazê-los de volta à unidade nacional. Já idoso, foi convocado para a cruenta guerra contra Solano Lopes, e voltou vitorioso. Apenas seus inimigos políticos, ou inimigos de tudo que as virtudes militares representam, teceram e tecem calúnias contra ele.

Mas, além de General, Senador e Ministro, Caxias foi um homem bom, capaz de abrir mão da última caneca de café quente para o soldado que vinha trazê-la no gelado acampamento. Uma influência marcante em sua vida foi sua esposa, Dona Ana Luísa de Loreto Carneiro Viana Alves de Lima, a Duquesa de Caxias. Para ele, apenas “Anica”.

Ana nasceu a 30 de dezembro de 1816. Seu pai era um político importante, o Desembargador Paulo Fernandes Ferreira Viana, conselheiro de D. João VI. Sua mãe era Dona Luíza Rosa Carneiro Leão, de família muito importante. Tinha 16 anos quando conheceu o jovem Major Lima e Silva, e ambos se apaixonaram. A família de Ana tinha diversos motivos para rejeitar o pretendente. A diferença de idade era de14 anos. Os Lima e silva não eram nobres, embora tivessem ascendido socialmente duas gerações antes de Luís. E este servia próximo ao Imperador Dom Pedro I, com o qual D. Luíza tinha um antigo ressentimento.

Mas ao fim, a família concordou e o enlace ocorreu em 06 de janeiro de 1833, com as bênçãos da Igreja Católica. Assim como acontece em nossos dias, correram notícias falsas, propagadas na imprensa por inimigos políticos dos Lima e Silva. Inventaram que o jovem Major teria sequestrado a moça contra sua vontade…

Citam algumas fontes que, no período de lua de mel, Ana teria meditado sobre os riscos de perder seu jovem marido, já veterano da Independência e da Cisplatina. Ela pediu a Luís que deixasse o Exército, para que não precisasse viajar para longe e correr risco de vida. Mas,  no momento em que ele decidiu ir ao Ministro solicitar sua baixa, a jovem se arrependeu e instou para que permanecesse na Força Armada. Quão diferente seria a História se o apaixonado recém-casado se tornasse um pecuarista ou cafeicultor, e não “a Primeira Espada do Império”?

Três filhos nasceram da união. Luiza Loreto Viana de Lima e Silva, futura Baronesa de Santa Mônica; Ana Loreto Viana de Lima e Silva, futura Viscondessa do Uruguai; e Luiz Alves de Lima e Silva, falecido aos 14 anos, causando uma incurável dor ao casal…

Imaginemos, caro leitor, em tempos que a comunicação era por cartas, levando semanas para chegar, a angústia dessa esposa e mãe, nas inúmeras vezes que o seu Luís saiu de casa para enfrentar rebeldes e mercenários, tropas argentinas e uruguaias. Eram longas jornadas por mar e em lombo de cavalo para os pampas gaúchos ou as serras de Minas Gerais. Ana passava semanas e meses sem notícias, com jornais espalhando notícias aterradoras sobre cada conflito, logo desmentidas por outros jornais. Sempre, a incerteza se veria seu amado Luís novamente. E, ainda, precisando encontrar forças para consolar e apoiar as esposas dos subordinados.

Mesmo hoje, a vida de esposa do soldado profissional não é a mais serena. No sangrento século XIX brasileiro, menos ainda. E sem telecomunicações nem Internet…

Por fim, quando o velho General já tinha 63 anos, e deveria somente lutar com palavras no Congresso, veio a convocação pessoal do Imperador para que Caxias fosse resolver o nó górdio em que se transformara a reação aliada às invasões paraguaias. Lima e Silva foi, sofreu, escapou por pouco da morte várias vezes, sendo a mais notável no ataque suicida em Itororó. Ainda achou tempo, em meio à chuva, fogo, lama e sangue, de enviar poesia para a sua “Anica”. Conquistada a capital paraguaia, um Caxias doente voltou e foi recebido sem pompas. Numa noite chuvosa, no porto do Rio de Janeiro, apenas sua adorada Ana lá estava para recebê-lo.

Ana era uma dama reservada e profundamente religiosa, que gostava de poesia. Era caridosa, procurando auxiliar viúvas e órfãos, vítimas dos conflitos. Era muito respeitada e benquista na Corte, tendo auxiliado no movimento que resultou na implantação do Asilo dos Inválidos da Pátria.

Dona Ana faleceu em 23 de março de 1874, deixando um vácuo na alma do grande guerreiro. Caxias escreveu na época: “Vivo agora muito triste depois do golpe que sofri com a morte de minha Duquesa, a quem eu amava muito e só hoje desejo ir para onde Deus a levou.” Seis anos depois, em 07 de maio de 1880, Luís foi ao encontro de sua Anica.

Muito é dito e escrito sobre a figura ímpar de Caxias. Mas, certamente, muito do que fez, foi por ter o apoio de uma mulher forte e estoica. Como muitas outras que a História não registrou…

Até a próxima.

Legenda da imagem: Fotografia de Dona Ana, do acervo do Museu Histórico Nacional.